Jorge Costa revela momentos da sua carreira


Numa entrevista ao Porto Canal, Jorge Costa, antigo futebolista do FC Porto, recordou vários momentos da sua carreira: As guerras com Jardel e os “professores” no FC Porto…

Jorge Costa foi um dos míticos capitães do FC Porto. Representou durante 13 anos o clube azul e branco e as memórias são muitas. Entre elas, está o papel de vários treinadores na sua vasta carreira de futebolista. Mas António Oliveira tem algo especial…

Em entrevista ao Porto Canal, o antigo defesa-central revelou também alguns dos elementos que foram essenciais nos dragões. Jorgue costa fala também do momento atual dos dragões.

Muito importante o FC Porto ser campeão este ano com estes miúdos

Jorge Costa acha que o FC Porto deve concentrar-se unicamente no campeonato, para poder pensar em voos mais altos na próxima temporada, será “muito difícil” a equipa passar os oitavos de final da Liga dos Campeões frente à Juventus, depois do “jogo atípico” da primeira mão, gaho por 2-0 pelos italianos no Dragão.

O antigo capitão dos azuis e brancos acha que o FC Porto “deve direcionar-se com tudo no campeonato”.

“Vejo que houve algumas dúvidas relativamente à equipa e ao Nuno por parte dos adeptos. Agora os resultados apareceram, vamos manter esta onda, é uma equipa jovem, não conheço o balneário mas percebe-se que há bom ambiente, há que apoiar e dar tempo a esta equipa, sabendo que no FC Porto é tudo para ontem. Era muito importante o FC Porto ser campeão este ano com estes miúdos e quiçá para o ano ser cada vez mais forte e poder voltar a conquistas de outro nível”

“Acho que o FC Porto está novamente no caminho certo”, acrescentou o ex-capitão, que levantou três das sete taças internacionais conquistadas pelo clube.

A conquista do Tri foi inesquecível, num percurso de glória e também alguns erros.

Braçadeira e número 2 nas costas: “O FC Porto estava e estará para sempre cá dentro. Herdar a camisola 2 do João Pinto e a braçadeira, para alguém que sente o FC Porto como eu sinto…”.

Professores: “Tive bons professores: João Pinto, Jaime Magalhães, Semedo… Um capitão sozinho não consegue nada, estive bem rodeado. Baía, Domingos, Nuno Espírito Santo, Paulinho, Capucho…”.

Braçadeira com 25 anos: “Tinha jogadores com mais ano de FC Porto, mais idade, as pessoas decidiram que seria eu a pessoa indicada para ser um capitão, um líder. É muito melhor ouvirem um Ricardo Carvalho, Lucho, Quaresma a falar de mim do que eu próprio. Ser líder é natural, não impões um líder. Não consegues treinar um líder, ou és, ou não és. Tem a ver com feitios, personalidade. Ou tens dentro de ti ou jamais vais ter”

O tri: “Era uma utopia. Éramos gozados com a história do tri. Conseguimos inverter a história, depois vem o Tetra e o Penta. Foi o tal clique de mudança que se calhar o FC Porto precisava para acabar com os fantasmas. Acho que o FC Porto andou muitos anos com um bloqueio do tri. Felizmente conseguimos desbloquear. Tetra? Foi uma consequência do que tínhamos feito. Éramos muito confiantes”

Jardel: “Tinha grandes guerras durante o jogo com o Jardel. Ele calava-me sempre e dizia: ‘Fala agora’. Chamava-o de tudo. Vês uma equipa toda a trabalhar e o Jardel…. Só que faz dois, três, quatro golos. Ainda bem que me calava”.

Erros depois do Penta: “O ano do Penta foi muito bom. Depois cometeram-se erros com contratações. Houve muitos erros em termos de contratações, pela qualidade e personalidade das pessoas. Foram anos complicados. Já não era o mesmo FC Porto. Tínhamos elementos que não deviam estar. Havia um perfil que não foi seguido. Não basta ser bom jogador. Às vezes é preferível não ser tão bom jogador. Eram bons jogadores, mas não eram bons jogadores para aquele FC Porto”.

Os primeiros passos no Foz: “Já lá vão muitos anos. O futebol sempre esteve dentro de mim. Ia para a escola e levava a bola debaixo do braço, jogava futebol de cinco e de sete no bairro. Aos 14 anos, por influência do senhor Amadeu, fui treinar ao Foz. Era juvenil de primeiro ano, fiz um treino e pediram-me logo o Bilhete de Identidade para me inscreverem

Central e avançado: “Era central, era ponta de lança e jogava com o número 10. Nesse ano jogámos por três vezes com o FC Porto e no final do ano tinha propostas do FC Porto, Leixões e Boavista. Fui com o meu pai falar com o presidente do Foz que, por razões escolares, disse que o melhor para mim era o Leixões ou o Boavista. Felizmente que a meio da conversa o meu pai virou-se para mim e perguntou o que queria eu. ‘Não há dúvidas, Porto’, disse. No FC Porto, com Costa Soares, jogava também como central e ponta de lança. Havia jogos que vencíamos por 15-0, 16-0 e estava lá atrás sem fazer nada. Nesses jogos o Costa Soares metia-me como ponta de lança. A diferença de tamanho era descomunal e marcava golos atrás de golos.”

Falhar o treino e o cabelo: “Lembro-me que no Foz havia treinos à terça e à quinta e o primeiro da semana era físico. Nunca gostei desses treinos. No FC Porto pensava que podia fazer o mesmo e faltar a treinos. Um dia, é certo, falhei um treino do FC Porto, não sei bem porquê. Talvez estivesse na Foz e tivesse de apanhar o 78 até às Antas, não sei. No dia seguinte o Costa Soares perguntou-me porque faltei ao treino e esse foi o primeiro choque da mudança do Foz para o FC Porto. A história do cabelo é outra. Tinha um corte à ‘rockabilly’ e o Costa Soares perguntava-me sempre se eu tinha vindo com a cabeça de fora da janela do elétrico desde a Foz. Costa Soares era um ser excecional, muito profissional e um apaixonado pela formação”

Ídolos e exemplos: “Nunca fui muito aquele jogador de olhar para outros e tentar fazer igual. Lembro-me de ir às Antas para ver o Madjer, um jogador diferente do que eu era mas que me enchia as medidas. Eu era portista, jogador do FC Porto e adepto de bancada, por isso o Madjer era o meu ídolo”

A estreia nos seniores do FC Porto: “Era o rapaz das chamuças, que era uma das praxes. Nunca mais me esquecerei do João Pinto a dizer ‘miúdo vai buscar as chamuças’. E lá fui buscar as chamuças à Primazia antes de irmos para estágio. Fui levantar a encomenda, apanhei trânsito e cheguei atrasado às Antas, já todos estavam dentro do autocarro. E eu a pensar o que fazer, as chamuças deixavam cheiro, os treinadores iam perceber… Mas, tinha de entrar no autocarro, estavam lá o João Pinto, o André, o Jaime Magalhães os meus ídolos. Anos depois fui eu que passei a fazer isto e sempre com chamuças. Como treinador sei hoje que isto faz mal, mas criava espírito de grupo

Jorge Costa, antigo capitão do FC Porto, recorda a agressão do então avançado do Milan em 1996.

Em novembro de 1996, ficou célebre o momento em que Jorge Costa surge com o nariz partido depois de um encontro com o Milan, para a fase de grupos da Liga dos Campeões. O antigo central dos dragões não esquece o episódio e deixa, mais uma vez, duras críticas ao ex-avançado liberiano.

“Vamos por partes. Há esse jogo em Milão, há uns anos atrás ganhar ao Milan, um colosso do futebol europeu… Foi algo que fez com o que FC Porto voltasse ao que era em termos europeus. Nas Antas o empate garantia-nos o apuramento, fizemos um jogo perfeito, empatámos o jogo. Weah era extraordinário, dos melhores jogadores do mundo. Tive de aumentar um bocadinho as minhas doses de agressividade. Ele era forte rápido, era um bicho. Assumo: fui mais agressivo durante o jogo com ele, tinha de ser. Não tinha outra forma de a parar”

“Acaba o jogo, ficamos cinco a dez minutos a festejar. Foi algo que chocou. Covardia, falsidade. Ter feito uma espera por mim de dez minutos… Agrediu-me à covardia. Quando olho para o lado só me lembro da cabeça dele. Se é no campo, perdeu a cabeça. Quem espera cinco a dez minutos é uma ação premeditada. Tinha um processo em tribunal. Foi um momento verdadeiramente mau”.

Jorge Costa conta que Fernando Couto é que criou a alcunha de “Bicho” e recorda o lado psicológico do treinador António Oliveira.

Titular indiscutível com António Oliveira: “Bebi muito de todos os treinadores e tive sucesso com vários treinadores, sistemas e metodologias de treino. Podes ganhar de várias formas, não há uma fórmula mágica de sucesso. O António Oliveira era um caso especial. Gosto muito dele. Ele tinha a capacidade de mexer connosco com a mística, a guerra… Com Robson era o jogo pelo jogo. Corremos, rematamos e ganhamos. Com Oliveira era mais a vertente psicológica, mais emocional. Antes dos jogos com o Benfica era bravo. Se o meu pai estivesse vestido de vermelho atropelava-o, se a minha mãe estivesse de vermelho atropelava-a. O Oliveira tinha a capacidade de mexer connosco”

Competitivo e concentrado: “Um dia chamaram-me de animal competitivo. Não jogar, não poder ajudar o meu clube no campo, custava-me. Não que fosse um mau suplente, mas sempre quis mais. Tenho uma carreira de que me orgulho, mas tenho noção de que não era um jogador extraordinário. Compensei sempre com dedicação, trabalho, empenho. Jamais um adepto me disse que o “Bicho” não deu tudo. Eu tinha algumas limitações, tinha noção delas e escondia-as ao máximo com aquilo em que era bom. Era muito concentrado no treino e no jogo e isso fez a diferença. Tinha colegas que eram melhores e era eu que jogava.”

Saída de Fernando Santos e entrada de Otávio Machado: “Jorge Andrade e Ricardo Carvalho eram dois belíssimos centrais. Não seria um problema se (Otávio Machado) fizesse dupla com o Jorge e o Ricardo. Às vezes na vida é melhor fazeres papel de burro. A história da braçadeira é mal contada. É verdade que fui provocado e sabem que fervo em pouca água dentro do campo. Houve uma provocação à qual me deixei levar. Com o V. Setúbal em casa estava 0-0 aos 44 minutos. Olho e vejo a placa com o número dois, pensei em dois minutos de compensação. Esperas pelo intervalo, tens uma conversa, explicas, se é que tinhas de explicar. Não saí contente. Estamos empatados em casa, não estamos a jogar nada. A história da braçadeira para o chão é mentira. Atirei-a ao Capucho, caiu ao chão. Fiquei revoltado com a substituição, não gostei. Depois obriga-me a pedir desculpa por uma coisa que não tive culpa. Orgulho falou mais alto, porque achava que não tinha de pedir. Faço um jogo na Escócia com o Celtic e já não sou capitão. Aí acabou”.

Charlton: “Acabou por ser uma experiência magnífica. Podia ter saído para o Mónaco, houve convite do Barcelona, Não queria sair do FC Porto, não era o dinheiro que me movia e acabo por ser obrigado a emigrar. Por vezes tudo acontece com um sentido, nada acontece por acaso. Foram seis meses em que só volto porque era o FC Porto e porque tenho uma conversa muito séria com José Mourinho. O Charlton queria ativar a opção de compra. Mourinho liga-me e temos uma conversa à imagem de Mourinho e à minha também, muito séria, frontal. Falámos com toda a honestidade, em que não há promessa de que vou para jogar”.

Mourinho, antes adjunto de Robson: “Era alguém com quem estava à vontade. Funciono muitos olhos nos olhos, não gosto muito de joguinhos. Fica decidido que voltaria e começo a ver as contratações. Digo com toda a frontalidade: perguntei o que vou fazer para ali. Fomos contratar jogadores ao V. Setúbal, ao Leiria, equipa B do Benfica. Aquilo assustou-me. Todos estes jogadores foram escolhidos a dedo. Paulo Ferreira, Derlei, Nuno Valente, Maniche… Entraram neste clube como uma luva. Tínhamos um grupo fantástico”.

O que filhos e netos de Jorge Costa podem ver e as contas com Co Adriaanse

“Estou no Museu do FC Porto, posso trazer os meus filhos e eles irão trazer os meus netos, isso já ninguém apaga! Valorizo agora o que fiz muito mais do que valorizava na altura em que jogava”, afirmou o antigo capitão dos azuis e brancos que fez parte da equipa que conquistou a Liga Europa (2002/03), Liga dos Campeões (2003/04) e Taça Intercontinental (2004).

Interrogado sobre a mística do clube, Jorge Costa disse ser algo que “não consegue explicar-se por palavras”. “Simplesmente sente-se”, afirmou o antigo camisola 2 que falou também da conversa que teve com Co Adriaanse, treinador que chegou ao FC Porto em 2005/06, época em que Jorge Costa rumou ao Standard Liège.

“Não ganho rancor ao Adriaanse porque olhou-me nos olhos e disse-me que tinha quatro melhores do que eu. Não posso ficar chateado nem guardar rancor, porque ele teve a coragem de me dizer: ‘tenho quatro [defesas] que são melhores do que tu. Infelizmente o meu percurso no Porto não acabou como gostaria, m as não lhe guardo rancor”, afirmou.